sexta-feira, 16 de maio de 2014

Tudo o que temos


Palestra de Doshô Saikawa Roshi
Tradução simultânea de Monge Genshô


           Dosho Saikawa Roshi inicia a palestra recitando um sutra em japonês.Monge Genshô traduz: O Sutra que ele recitou agora é: “ O Dharma incomparavelmente profundo e de uma sutileza infinitas é raramente encontrado mesmo em milhões de milhões de ciclos universais, possamos nós agora ouvi-lo, aprendê-lo, guardá-lo.Ouçamos cuidadosamente as palavras do Tathágata.” 
Dosho Saikawa Roshi: Quando dizemos o Buddha, o Dharma e a Sangha, estes três tesouros, isso parece na nossa mente alguma coisa distante, um lugar muito alto.Mas isto é realmente aqui e agora. Não é um lugar distante porque tudo o que nós temos é apenas este momento.Este momento nunca vai voltar novamente nesta eternidade deste inteiro universo.Cada momento é apenas um momento. Não pode ser comparado com qualquer outro momento.Os seres humanos tem tido muito progresso, muito. Assim nós temos uma maneira de comparar com ontem, com o ano passado, assim nós podemos pensar sobre o passado, pensar sobre o futuro e comparar um com o outro e assim esta nossa cultura de progresso, este progresso que vem aqui e agora. Então a atividade mental é muito boa também para os seres humanos e por causa disso nós esquecemos que tudo o que nós temos é este aqui agora. Não pode ser comparado com nenhum outro momento.Assim este momento é o momento da mais alta iluminação.Por que este momento é iluminação? Porque a cada momento nós somos um com todo o universo. Quando eu disse durante o primeiro zazen: um espelho contém todo o universo a cada momento, é um em todo o universo a cada momento, sem nenhuma perda, sem nenhuma preferência, sejam um com todo o universo, sejam um com este inteiro universo, recebam sem apego e deixem ir sem apego.Mas se em nossas mentes nós temos apego, comparamos com as nossas memórias e com os nossos pensamentos acerca do futuro então ao mesmo tempo a nossa atividade mental é uma ferramenta útil, mas ao mesmo tempo cria doença. É fácil de entender que os nossos olhos são espelhos sem identidade própria, sem preferência, sem apego; a mesma coisa com os ouvidos que são espelhos para sons, sem identidade, sem apego, sem preferência.Apenas sejam um com todo o universo. Nosso nariz é um espelho para os cheiros, sem identidade, sem apego, sem preferências e a língua é o espelho para os gostos. Sejam um com todo o universo, sem apego, sem preferências.Nosso corpo e nossa pele também são espelhos. Recebam o frio e o calor, sem apego, sem preferência. Mas parece que a nossa mente tem um self, uma identidade, porque a mente tem apego. Na nossa mente nós temos uma lua imaginária dentro de uma gota de orvalho. Quando a lua está no céu ela sempre está dentro da gota de orvalho, assim parece que a lua existe dentro de uma gota de orvalho, dentro da água, dentro do oceano. Assim realmente parece que a lua existe dentro da água. Assim a nossa mente cria ambas as duas coisas e a doença.

 No budismo nós temos muitos tipos diferentes de análises sobre o dharma. Os três selos do dharma: o primeiro é impermanência, todas as coisas estão mudando, momento a momento; segundo ensinamento é não há eu em cada dharma, em cada fenômeno; o terceiro é o nirvana, a tranqüilidade é agora, aqui. Estas análises não são metafísicas ou psicológicas, não é filosofia. Budismo está sempre falando acerca disso.Falando sobre Buddha, Dharma e Sangha e estamos falando sobre a nossa vida a cada momento. Buddha, Dharma e Sangha são vocês mesmos, sua identidade, seu self. Vocês não podem achar em outro lugar. A iluminação também não é em algum lugar fora daqui, as coisas estão exatamente aqui, agora. Porque quando vocês existem todo o universo existe. Quando o universo existe vocês existem.Mas a atividade mental pensa de forma diferente: o mundo existe antes de eu ter nascido e o mundo existirá depois da minha morte.Talvez seja verdade, mas o zen não está nas coisas da atividade mental. Nós estamos falando sobre essa existência real, agora. Quando ela existe o mundo existe. Quando o mundo existe, nós existimos, porque o espelho está sempre vazio, totalmente vazio, por causa disso todo o universo está dentro dele a qualquer momento, cem por cento, não mais, não menos.Se vocês realmente alcançarem este ponto, se vocês entenderem este ponto vocês compreenderam completamente ao mesmo tempo os três selos do Dharma: a impermanência, as coisas estão mudando momento a momento; nada tem self, nada tem identidade própria, existe por si mesmo e terceiro, o nirvana, a tranqüilidade é exatamente aqui agora.

 Nós temos a tendência de tentar resolver os problemas com a nossa atividade mental, nós andamos assim nas nossas vidas.Muitos dos problemas podem ser resolvidos dentro da sua atividade mental. Mas esta questão acerca da verdadeira identidade, do verdadeiro si mesmo, da nossa verdadeira natureza, da questão da vida e da morte, não pode ser dissolvida dentro da atividade mental, não pode ser resolvida na psicologia, não pode ser resolvida na ciência, nem na filosofia porque todas essas respostas, nesses métodos, vem do dualismo. Esta questão de vida e morte está além dessa atividade mental. Mesmo Shakyamuni Buddha levou seis anos para realmente encontrar o truque da mente, do self. Levou seis anos para alcançar o truque de todas essas coisas.Então este truque é uma boa ferramenta para resolver os problemas. Mas ao mesmo tempo este método cria a dor e a agonia. Mesmo que vocês encontrem respostas dentro da filosofia, da ciência, estarão gerando esse sofrimento porque tem estes dois lados, porque a resposta do dualismo é sempre tome este caminho ou aquele outro, então esta dualidade cria dor e agonia ao mesmo tempo. Então vocês têm que ir além deste truque da mente, então vocês serão totalmente satisfeitos, então vocês entenderão que este momento é o nirvana e a completa tranqüilidade.

 Um discípulo francês meu me disse: é fácil entender que as coisas estão mudando momento a momento, mas é muito difícil entender que não há identidade, que não há self, que o nirvana e a tranqüilidade estão aqui agora neste momento. Mas se vocês forem além das suas mentes poderão alcançar esta tranqüilidade. Vocês podem alcançar esta tranqüilidade pelo verdadeiro zazen. Se vocês tirarem o conceito da sua mente tal como bom ou ruim, ganho, perda, existência, não existência, se vocês tirarem ambos os lados de concepção, o que restará? Vão mais fundo e alcancem este ponto, além de todas as concepções.

Alguém tem alguma pergunta?

Pergunta: O que significa o verdadeiro zazen?

Resposta: Estou falando do shikantaza. Shikantaza significa que qualquer coisa que surge na sua mente você deixa ir sem se apegar a ela. As coisas quando surgem na vida diária você tenta guardar, ficar com elas na memória, mas não fazemos isto no shikantasa.Quando surgem coisas ruins na nossa mente, na vida diária, nós tentamos afastá-las, tentamos esquecer rápido. Em shikantaza também não fazemos isto. Quando vem deixamos vir, quando vai deixamos ir. Não fazemos contatos, não tocamos estas coisas. Nós deixamos passar. Se nós tentarmos guardar as coisas boas ou nos livrarmos das ruins, isto é dualidade, como este lado, aquele lado. Deixar ir e vir é ficar além desse dualismo. Você consegue fazer isto no zazen. Este estágio é iluminação. Se você acordar para isto você pode ir mais fundo.

Pergunta: Somos originados da vacuidade e para lá voltamos após a iluminação.Então por que o ciclo é necessário?

Resposta: Porque antes da iluminação você tem ilusão. Porque antes disso você sente dor e agonia, assim você cria o sofrimento.



Palestra ministrada para a Comunidade Zen Budista de Florianópolis e amigos, na abertura oficial da Sede da Comunidade, em Florianópolis no dia 03 de outubro de 2006.
Decupada da gravação e digitada por Jane Denkô.  

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